Se, em algum ponto da vastidão do horizonte oriental, surgem cálidos os sorrisos do rei dos astros, sabe-se que, após o máximo de sua alegria transbordar, na mesma medida em que cresceu, declinará para mergulhar a escuridão. O que deveria prender a atenção é que este declínio romper-se-á exatamente na medida contrária do despontamento: o ocidente. Minha tristeza ácida poderia condenar algum dos pontos cardeais e clamar ou pelo claro ou pelo obscuro, mas, se assim o fizesse, violaria todo o meu amor, pois é exatamente na sucessão desse par aparentemente inimigo que o verdadeiro valor de cada um se faz perceber. Esta constatação enevoa minha cólera e me conduz a perceber que a claridade contém a escuridão para surgir viva, e que a escuridão lampeja claridade para existir.
A única fonte de energia vital é solar, e os sistemas armazenam-lha sob diversas naturezas para permitir a continuidade de seus funcionamentos. Todas as variações de calor circundantes da vida equilibram-se dos jatos vivificantes e mortíferos do Sol. De onde se conclui que apenas o luminoso possante concede a vida. Justamente, entretanto, em concedendo a vida, da sua desmedida nasce a morte. Quereria romper em prantos em favor da vida e em negação da morte, mas me seria empreendimento inútil, uma vez que é exatamente a vida em excesso o caminho da morte, e a vida não pode haver sem a morte, bem como a morte não pode haver sem a vida.
O corpo humano colore-se e descolore-se ao entrar em níveis diferentes de intimidades com o astro-rei, produzindo sensações tácteis doces e amargas, frias e quentes de vida, gélidas e ferventes de morte. A qualidade do que é frio não se separa da qualidade do que é quente, posto que a doce lembrança do quente se manifesta na amarga sensação do frio, e a amarga lembrança do quente se desfaz na doce sensação do frio. Se levei a cabo a noção de pertencimento das contrariedades, foi para acentuar o caráter destemperado da alma humana que, ao não se contentar com a qualidade positiva de um objeto, busca na qualidade negativa a alternância que desembocará a destemperança.
A performance das reações físico-químicas na superfície tórrida do globo de fogo avivam o poder solar, uma vez causadores do mesmo poder. Entretanto, o vigor provocado pela demonstração desse poder já contém em si os grânulos para a supressão da própria vida solar. A alternância sucessiva das danças de labaredas determina o esgotamento energético do Rei, que, caindo na profundeza abissal da morte romperá todos os pares de contrariedades que sustentavam sua existência e sua relação com outros objetos em existência.
Lorenzo Baroni Fontana